MADRUGADA ACESA
Ninguém se faz bruxo, a vida elege e impõe!
Dedico estes poemas às luzes nas madrugadas…
” Sonhos só existem através da memória que os alimenta.”
Bunuel
insular
Fixo, paralisado
apenas o som do coração.
Enraizado, observa!
Aves migratórias circundam a cabeça
numa frenética formação
capturadas por argolas de sombras.
A tarde, desfaz-se
por detrás do horizonte .
Box 32
A cidade desgoverna-se .
18 horas em ponto.
Vermelho, amarelo, verde !
Tua passagem leve e delicada
insaliva o bar do mercado.
Sabor bem ilhéu
nesta brisa do entardecer.
Na crônica do poeta sem poesia
um Dom Quixote de lata
enormes tetas
uma esfera
e a dor enraizada.
Talvez um charuto com a dama de luto!
Na crônica do poeta sem poesia
um cálice partido
o tempo sem tempo
e o amor vencido !
Te encontrei
flutuando no horizonte.
Como se o destino
estivesse escondido logo ali
pertinho da imaginação!
tempestade
Pelo som do trovão
pela sombra da lua
abrigado por três ave-maria
bate forte o coração !
Explodem as Serpentes aladas
faiscando no espaço…
A mãe morta
atravessa a cozinha!
Chove bastante…
O olho
abriga nossa canção.
Avenida beira-mar,
antigas esquinas, praias desertas.
Um bar na tarde, um gesto amigo
um canto impreciso.
Que saudades do Miramar!
Denso está o ar da cidade.
Sobreviventes náufragos
descansam
sobre a sombra da velha figueira !
Pelas trilhas interiores
do Ribeirão à ponta do Rapa
benzedeiras, rezas, até bruxaria.
Cruz credo!
Nos becos de Antuérpia
noite dos reféns.
A bailarina, a puta e o marinheiro
borbulham na taça.
Afogados
estendem seu olhar para as estrelas.
Rituais profanos que fazem sonhar
rezas d’além mar, antigas alquimias.
Os cubículos avermelhados
fazem com que a noite
não tenha mais fim…
Que saudades do Miramar!
Templários
para Péricles Prade
Estalos da cavalaria
ressoam pelos becos do bairro gótico.
Lanças são cravadas no coração.
O castelo estratificado
guarda frascos de alquimia.
Na noite,
um rei apareceu do outro lado da encosta
iluminando a Rambla
Canção para América Latina
Artérias expostas, vitima do abuso.
Latina América saqueada!
Sugam tua seiva,
empurrando para o céu teus povos antigos.
Expões um esqueleto que insulta
(aos que se fartam nos banquetes oficiais).
Latina América saqueada!
Chora tua flauta , de encontro
aos tambores retesados do Rio de Janeiro.
aos tambores retesados do Rio de Janeiro.
Visitas siderais
nos teus altiplanos sinalizados
América Latina do Universo!
Guevara , Neruda,Tom Jobim
guerreiros entrincheirados.
Nossa sonoridade!
com sua flecha incendiada!
Este mar
(que desperta o sol)
acende o dia.
Mar de esperanças
mar dos aflitos
mar das espumas!
Ah! Este mar
berço da lua e das sereias encantadas.
Mar dos golfinhos enlouquecidos!
Abriga minha ilha
em todas as tempestades.
Janela pra Jamaica
Noite de sábado
soaram os tambores e
um encanto espalhou-se pela ilha.
Quantos amores
nas velhas canções do mar?
Quando clareou
ainda soavam os tambores!
dominó
Sucessivas batalhas
em preto e branco.
Trama de números versus memória.
As passadas são espetaculares…
Subitamente interrompe-se a guerra
e contabilizamos os mortos
boi de mamão
“vamos moreninha
vamos até lá
vamos lá na vila
para ver meu boi brincar”
Pelas calçadas
soam os tambores
alimentando o sonho.
E o boi brincou
perseguiu a noite
até se ofuscar no clarão do amanhecer
pra depois, subir aos céus.
Vamos moreninha
aceita esta flor ela é do limoeiro,
vai perfumá o nosso amor!
O vento sul que nos abriga
pouca coisa reconhece
nos escombros da cidade.
O mercado amarelo ocre
com a velha baleeira
fincada no ventre.
Um pote de barro, uma escama brilhando ao sol!
A matraca ressoa
enquanto a vida vadeia pelas calçadas.
Adiante
a graciosa Alfândega
pertinho do desaparecido Miramar.
Nossa Senhora do Desterro
onde estão teus assassinos?
POEMAS EM PRETO E BRANCO
OU
MORTE AO TAPETE VOADOR !
Carruagens aladas
farejam o inimigo.
Línguas de fogo penetram e queimam
(os corpos estão suspensos no ar).
No centro do mundo
mal dormida cidade
Envenenada a entranha
expõe dissimulada alma.
Guerreiros de guerras antigas
ecoam no golfo
combatendo em melodias lineares.
Envenenada a entranha
responde com estrábica convulsão.
Por detrás do sorriso
escorre sangue pelos cantos da boca.
11 de setembro
aço latino flutuando em estação espacial.
Nos ventres, o côncavo da fome!
Odores transgênico contaminando e asfixiando
o mundo de todos nós.
o autor
Semy Braga é médico, artista
plástico e poeta, natural da
ilha de Santa Catarina.
Sua vivência insular numa cultura
açoriana, é base das suas obras.
publicações
1983 - o despertar de um anjo azul – poemas
1986 - manifesto por uma estética tupiniquim – ensaio
2004 - esquina do luar – poemas
2004 - raízes d alem mar – poema de Osmar Pisani
pinturas de Semy Braga e Vera Sabino
2005 - madrugada acesa – poemas
2007- jardim dos aromas
contato:
semybraga@websabino.com